Melhores 2012 . Discos de cá

Confira os melhores discos brasileiros do ano, selecionados pela equipe da Soma

POR EQUIPE SOMA
publicado em 18.12.2012 15:31  | última atualização 19.12.2012 14:59

Melhores 2012 . Discos de cá POR Felipe Ribeiro / Equipe Soma

“A música popular é uma das artes mais peculiares e desenvolvidas da cultura brasileira”, explica Tom Zé em entrevista sobre seu novo álbum, Tropicália Lixo Lógico. E mesmo quando o álbum, como obra artística, vai trocando sua posição de relevância com a faixa solta em mp3, podemos medir o desenvolvimento da música brasileira com essa lista de fim de ano da Soma. Hardcore, eletrônica cabeça, rap boladão, roque psicodélico, metal experimental, medalhão da MPB: o abraçaço da diversidade musical nacional mostra que o disco de longa duração – incluindo as mixtapes e EPs – ainda encontra eco importante nessa peculiar arte tupiniquim.

E a produção brasileira em 2012 vai além dos nossos 20 primeiros colocados, devidamente dissecados pela equipe fera da Soma para sua apreciação. Desta vez mudamos as regras da eleição e, emprestando a ideia da lista Pazz & Jop, clássico do Village Voice, convocamos nosso time de eleitores a distribuírem um determinado número de pontos aos discos escolhidos. No final desse texto você pode encontrar todas as obras indicadas por nosso corpo de jurados, um panorama completo do que mais chamou nossa atenção na música brasileira este ano.

Em 2012 nosso time de jurados foi composto por Arthur Dantas, Camila Alam, Dago Donato, Daniel Tamenpi, Eduardo Roberto, Eduardo Yukio Araújo, Jonas Pacheco, Katia Abreu, Pedro Pinhel, Raquel Setz, Stefanie Gaspar e Tiago Moraes, além dos editores da Soma Mateus Potumati e Amauri Stamboroski Jr. e o repórter Paulo Marcondes.


20.TEST . Arabe Macabre
Travolta Discos
 
A dupla João e Barata continuou em 2012 estacionando a kombosa nas filas de shows e picos paulistanos para os happenings mais divertidos e brutais do metal brasileiro. E, para engrossar essa aura DIY death metal conceitual os caras lançaram mais um pedradão na orelha do jovem brasileiro. Arabe Macabre é um trabalho que mostra como as diferentes levadas de metal podem confluir para um resultado estético pleno, reunindo o grindcore, o death, o crust, um tanto de filosofia e um outro toque mágico, obscuro. Fora isso, os caras aproveitaram o lançamento do disco para dar uma cutucada nos dinossauros do metal Dorsal Atlântica, que fizeram um crowdfunding de R$40 mil para gravar seu novo álbum. Para o Test, foram necessários apenas 50 reais, que podem ser revertidos em “outro projeto, numa prensagem do próprio Arabe Macabre, ou em maconha mesmo”, segundo a banda. [Eduardo Roberto]

Ouça aqui Arabe Macabre


19. M. Takara . Fantasma (EP)

Desmonta
 
Fantasma apareceu na rede sem nenhum grande anúncio, mas o novo trabalho do multiinstrumentista Mauricio Takara não é apenas uma coleção de músicas rejeitadas. O EP traz os emaranhados instrumentais que carregam a marca de Takara, entre a organicidade e a frieza, equilibrando aspectos da produção de música eletrônica e do formato livre de canção. As músicas aparecem como que submersas, desde as mais lentas e cantadas (“De Onde Eu Estou”, “Daqui Pro Largo”) até as de eletrônica mais "purista" (“Limpo”, “Panelada”). Como todo experimentalista, Takara é meticuloso o suficiente para equilibrar as forças, entregando um conjunto de sons que não apenas carregam informação musical para nerds mas efetivamente fluem com uma atmosfera onírica e imperfeita. [Eduardo Yukio Araújo]




18. Hurtmold . Mils Crianças

Submarine
 
Para o Hurtmold de Mils Crianças, menos é mais – e em mais de um nível. Com apenas 36 minutos de duração – ao contrário de Hurtmold, que, com sete faixas, tem 41 –, o novo álbum condensa a música do sexteto, eliminando grande parte das repetições que fizeram com que muita gente grudasse a tag de post-rock no grupo. “Talvez envelhecer signifique que você consiga resolver as coisas", explicou a banda em entrevista à Soma. Esse pode ser o resumo do quinto álbum dos paulistanos: resolução de ideias num curto período de tempo. Se o disco pode soar mais fácil e “musical” para quem ouve, também se tornou mais complexo para quem executa. No lugar das repetições, um leque mais aberto de influências, que vão da percussão africana ao progressivo guitarreiro, num som mais focado e até mesmo musculoso – não à toa o grupo troca de bom grado a pecha de “post” pela abertura sonora e conceitual do punk rock. Quando se está mais velho e a raiva e a angústia juvenil se esvanecem, punk passa a ser a sua promessa inicial, que pode ser relembrada pela via mística: faze o que tu queres será o todo da lei. [Amauri Stamboroski Jr.]

Ouça aqui "Chavera", de Mils Crianças


17. Cidade Cemitério . Asa Morte

RAW Records

“Essa cidade não foi feita para pessoas e sim para pessoas dentro de carros, pessoas dentro de prédios: pessoas dentro da máquina de produção-consumo.” A relação conflituosa entre o punk e o poder sempre foi importante para a identidade do gênero, mas quando você resolver gritar e apontar os defeitos de sua cidade (no caso, Brasília), o conflito se intensifica. É basicamente o punk frente aos três poderes nacionais, enfrentando-os e mostrando que a construção de uma cidade que “não seria dividida em bairros ricos e bairros pobres” possui problemas graves, seja pela Asa (M)Norte e a sua versão extremamente particular do que pode acontecer com a especulação imobiliária, ou por outro embate já em sua raiz, em seu plano: o urbanismo controverso de Lúcio Costa com a arquitetura modernista do comunista Niemeyer.

Se o Aborto Elétrico – via Legião Urbana – formou uma “geração CQC” ao som de “Que País É Esse?”, o Cidade Cemitério representa uma nova e destoante oposição de esquerda, que não quer reclamar sobre a corrupção ao lado do Marcelo Tas e sim olhar para o lado, ver que tudo o que foi prometido e planejado, foi esquecido e que a cidade em que “haveria integração ao invés de discriminação”, é uma das mais xenófobas e desiguais do Brasil. Brasília não é apenas a capital para a banda, é também o cemitério do país. [Paulo Marcondes]

Ouça aqui Asa Morte


16. Jair Naves . E Você Se Sente Numa Cela Escura, Planejando a Sua Fuga, Cavando O Chão com Suas Próprias Unhas

Travolta Discos / PopFuzz

É como um conto de terror de Edgar Allan Poe – trancafiado em um cubículo, sem chance de escape, só resta ao prisioneiro cavar o próprio chão. Pode parecer claustrofóbico e atemorizante, mas para Jair Naves, que usou a situação para nomear seu primeiro álbum solo, a visão é otimista. “Eu já falei bastante sobre esse lado sombrio da vida, viver é legal, envelhecer é legal”, explicou o músico em entrevista à Soma e são sobre esses dois pontos que Jair Naves constrói as narrativas de seu primeiro álbum: a esperança e a passagem do tempo. Se no Ludovic, ainda na primeira demo, o músico gritava que era um homem de meias palavras, hoje, mais velho e maduro, pode sentir-se um homem de palavras cheias, daquelas que vão direto ao ponto e que conseguem expressar de modo visceral – ora melancólico, ora mais furioso – ideias concretas.

As temáticas de suas letras mudaram: no EP Araguari havia um pouco de tristeza, como em “Silenciosa”, enquanto o álbum dá espaço para coisas cotidianas, como a última música, “Eu Sonho Acordado”, em que numa fuga de realidade, daquelas dentro do ônibus, pensando sobre a vida, o músico versa: “Nas três horas diárias que eu passo / espremido em um ônibus lotado / indo e voltando do trabalho / eu sonho acordado / com a vingança dos torturados, / com a mulher que vai envelhecer ao meu lado, / com o meu pai ressuscitado...”. Jair Naves conseguiu o que tentara fazer com suas músicas: se comunicar diretamente com as pessoas, “não parecer um rock cantado pelo Machado de Assis”. [Paulo Marcondes]

Ouça aqui E Você Se Sente Numa Cela Escura, Planejando a Sua Fuga, Cavando o Chão com Suas Próprias Unhas


15. Os Estudantes . Pedras Portuguesas Na Sua Cabeça

Läjä Records

Com mais de dez anos de carreira, os cariocas d'Os Estudantes permanecem sendo uma das mais importantes bandas de punk rock do Brasil. Pra quem duvida, Pedras Portuguesas na Sua Cabeça retoma uma condição nada fácil pra quem milita no estilo: o vigor e a relevância, o exercício quase catártico de se manter agressivo sem parecer um pastiche. Como em todo bom disco que bebe em fontes da SST e Dischord, desprendimento é necessário: as pedras que atingem o ouvinte são originárias de um sem número de riffs cirurgicamente inseridos velocidade e pancadaria. Os mais de três minutos de "Espírito Seco" formam um quase épico entre as tradicionais canções de um minuto, minuto e meio. Em "Fogo Amigo", eles cantam "Eu vou tirar a sua carcaça!", e, de fato, Os Estudantes destroem qualquer resistência com um disco que, em um mundo ideal, geraria quinze hits pesados e pontiagudos como pedaços do calcário que revestem o calçadão de Copacabana. [Eduardo Yukio Araújo]




14. Amiri . Êta Porra! (EP)

Independente
 
O Amiri foi a última pérola do hip-hop paulistano a estourar em 2011. A faixa “Êta Porra” surgiu despretensiosa no Soundcloud e, em apenas um fim de semana, atingiu a marca de dois mil plays (hoje já são mais de 17 mil). A música era um aquecimento para o Êta Porra - EP, que também conseguiu causar um impacto único na cena de rap brasileira. Afundado até o pescoço na cultura africana, que reflete até no seu flow, cheio de sotaque e pontuações estranhas, o EP de dez músicas (e uma bônus) dá um sabor mais true ao revival afrobeat de butique paulistano. O discurso do rapper também procura estabelecer uma posição importante, de contraponto com o resto da cena hip-hop, mas partindo do mesmo clichê auto-referente, do rap consciente do seu papel artístico e social. Amiri dá o pulo do gato na questão enxergando o rap de um ponto visto crítico e histórico, mas sem esquecer que é importante fazer boa música. [Eduardo Roberto]





13. MarginalS . (segundo disco)

Independente

Experimentando para além do que havia feito no seu primeiro registro, o trio paulistano MarginalS cria uma personalidade forte em seu literal (segundo disco). Bebendo na fonte do free jazz e mesmo na improvisação livre britânica, o grupo encontra também em Sun Ra um espírito similar em faixas como “I” e “V”, desconstruindo formas tradicionais com o auxílio de uma gama grande de sons sintetizados que não soariam fora do lugar em composições do homem de Saturno. Por vezes o disco chega a ser dançante, como o groove fechado de “VI-b”, mas em geral é uma obra aberta, que se (re)constrói a cada audição, auxiliado pela falta de pistas do grupo, que elimina qualquer referência narrativa ao nomear as faixas com números romanos e colocar na capa, no lugar do rosto dos integrantes, uma identidade mais invisível – suas digitais. [Amauri Stamboroski Jr.]





12. Lucas Santtana . O Deus Que Devasta Mas Também Cura

Diginois Records

O quinto disco do baiano Lucas Santtana não é apenas uma continuação de sua procura por camadas de som em meio a composições estruturadas de forma tradicional. O Deus que Devasta... vai além ao propor uma diversidade que é mais inventiva que a experimentação voz-violão-samples do disco anterior (Sem Nostalgia, 2009): embora as canções estejam mais bem delineadas esteticamente, o resultado é mais desafiador do que tudo que Santtana produziu anteriormente. Partindo de uma aparente preocupação com um lirismo entre o romântico e o reflexivo, o álbum é um caleidoscópio de bem cuidadas e arranjadas composições.

Exemplo bem acabado da habilidade do compositor em criar cenários e atores que se aproximam da universalidade é o rock "Para Onde Irá Essa Noite", raro momento de retrato instantâneo de uma situação desenhada em formato de música. Aqui cabe observar que Santtana, badalado na gringa e por aqui, entregou um trabalho que se aproxima do ouvinte tanto pela "música que faz pensar" como pela canção pop em si, uma miríade de emoções e observações humanas, capaz de satisfazer cidadãos de Belém a São Paulo. [Eduardo Yukio Araújo]




11. Flow MC . SensaFlOWnal
(Mixtape)

Casa1

No jogo do rap nacional, poucos nomes arriscam tanto (e conseguem um resultado tão relevante) quanto o Flow MC. Depois de encontrar sua voz na mixtape Vileiro em 2011, Júlio César quis aumentar o nível com SensaFLOWnal – a começar pela escolha eclética dos beats. No ano em que o trap, variação mutante do dirty South, se tornou a principal novidade na eletrônica dos EUA, Flow é o único MC brasileiro que consegue dar sabor local aos nervosos experimentos dos beatmakers brasileiros, que costumam escolher o Notorious do Ipiranga para soltar suas tracks mais desafiadoras.

Mas aos “beat trap” Flow junta outros ritmos, com sons de balanço 60-70 (“Por Que” e “Pode Para”), reggae (“Chá de Quebra”) e até mesmo discoteca (“Nostalgia”). Por cima disso tudo, a levada peculiar que descola o rapper dos seus colegas de geração, entortando o verbo na crônica de quebrada “Pisa Fofin” ou simplesmente listando rimas na manha e criando conexões na lombra de “Junto e Misturado”. A nova maneira de retratar o cotidiano da periferia que marcou Vileiro se repete, como no relatório da maloqueiragem escolar “Muleke Problema”, com direito a scratches de “Nego Drama” por KL Jay e beat de Laudz.

O outro tema principal do disco é aquele mais perene do pop: mulheres. Da galeria de tipos de “Algumas” à narrativa à Ogi de “Amnésia”, Flow cria novas maneiras de se lidar com o amor e a paixão dentro da linguagem do rap nacional. Entre as biatches e as de fé, plantado queimando um na calçada do posto de gasolina, Júlio César pode começar a levar a sério o seu nome próprio de imperador enquanto coleta mais material bruto para a próxima missão. [Amauri Stamboroski Jr.]




10. Caetano Veloso . Abraçaço

Universal Music

Ouvir Caetano Veloso é sempre um jogo de ler além da superfície. Em seus discos, o papel do artista como criador muitas vezes é menos importante do que o do artista como curador, que reposiciona símbolos para criar novos significados. Quando canta “A Bossa Nova É Foda”, o compositor não está se referindo apenas à música criada por João Gilberto e seus contemporâneos: está reverenciando um momento de reinvenção do Brasil, que passa pela Tropicália e chega a ícones pop como Anderson Silva, citado na letra. Para Caetano, a bossa nova ainda é o paradigma, a forma de leitura mais avançada de um país que enfim se tornou um ator global, mas que não quer perder de vista sua densa tradição cultural. Também segue sendo paradigma a figura de Carlos Marighella, guerrilheiro homenageado em “Um Comunista”, que em 2012 foi tema ainda de uma biografia, um filme e uma música dos Racionais. O melhor é que, em Caetano, o uso de referências tão antigas não é nostalgia restauratória, mas fruto da atualidade desses temas.

O olhar para o presente é mais evidente na sequência “Funk Melódico” e “Vinco”. Na primeira, o tamborzão sugere sensualidade, mas a melodia tensa azeda o molho e instaura a crise, que culmina no refrão “o ciúme é o estrume do amor”. O sexo fica todo para “Vinco”, um jazz-blues relaxado, mais na cadência de um setentão do que um suarento baile funk. A conversa de pé-de-ouvido é cheia de metáforas: “vinco” é o “terreno tenro” onde o amante “finca o seu estandarte”, ou ainda a “terra vermelha e rosa de pétala íntima, onde eu hasteio uma nação”. Se Abraçaço não tem o esmero e a força de , melhor álbum de sua “fase indie” até aqui, é prova mais do que suficiente do quanto Caetano Veloso ainda tem a oferecer ao mundo. [Mateus Potumati]

Ouça aqui Abraçaço


9. Holger . Ilhabela

Avalanche Tropical
 
O Holger de Ilhabela é uma banda indie que desencanou do carão. Aquela festa que toca os últimos hits do underground rock americano ou britânico (tinha aquela época dos hits canadenses também) não está com nada. Ser cool é curtir a vida, transar, ouvir Lulu Santos e guitarrada, Paralamas do Sucesso, regata cavada, praia e sol. O Holger de Sunga já apontava nessa direção, mas ainda era impregnado daquele ar caribenho/afrobeat para blogueiro gringo gostar. Em Ilhabela, essa sensação se transforma em um prazer, fica tudo mais fluido. Esse sentimento está ali, no timbre rock Brasil anos 80 das guitarras de “Tonificando”, ou na tranquilidade ingênua e duplo sentido de “Me Leva Pra Nadar”. As comparações com o axé, a tag “micareta indie”, muito usadas para explicar (muitas vezes com uma conotação negativa) o som dos paulistanos, são ainda mais despropositadas. Não é mais uma banda buscando novas tendências, se mostrando antenada; agora são uns playboys brancos que ouvem a Blitz, carimbó e música congolesa enquanto estão no caminho para a praia de Ilhabela. [Eduardo Roberto]

Ouça aqui Ilhabela


8. Kamau . "...Entre..."

Plano Audio

Um dos pilares da cultura do rap é adquirir, cultivar e mostrar conhecimento – musical, lírico, rítmico, cultural, social, onde mais você se garantir. “Dropping science like Gallileo dropped the orange”, dizia um grupo que, se você não conhece, é melhor dar um Google pra não pagar comédia. Como numa utopia iluminista, o conhecimento é o que separa meninos de homens no hip-hop, e foi por meio da ciência que o rapper-matemático Kamau tornou-se algo como um guru da nova geração – Emicida, por exemplo, nunca escondeu que ele é uma de suas influências maiores.

Quatro anos depois de puxar o cordão do renascimento do rap com Non Ducor Duco, o rapper do Tucuruvi mostra novamente que está no jogo para conduzir, não para ser conduzido. "...Entre..." é ciência do começo ao fim: da colagem de samples de RZO, Criolo, Racionais, SNJ e do próprio Kamau na faixa-título ao diálogo de skatista para skatista com Lupe Fiasco em “21|12”; da ode à ética espartana do rap brasileiro de “Música de Trabalho” à vibe Brother Ali/Non Prophets de “Por Onde Andei”. Em 14 faixas, Kamau “drops science” com a sutileza de um nobre, sem esforço, colocando a composição em primeiro lugar. "...Entre..." não é apenas seu melhor disco até aqui, mas uma síntese de tudo que fez dos últimos anos uma época inesquecível no rap brasileiro, e um guia do que faz a cabeça da nova geração. [Mateus Potumati]




7. Tom Zé . Tropicália Lixo Lógico

Natura Musical

Depois de aprofundar seus estudos do samba com discos dedicados ao pagode e à bossa nova, Tom Zé fez uma escolha que seria arriscada para qualquer outro artista, ao escolher a Tropicália como tema de seu novo álbum. Diferente dos códigos razoavelmente fechados dos sub-gêneros do samba, mais fáceis de serem identificados e assim subvertidos, a Tropicália é mais um conceito quase aberto, um estado de espírito.

Mas o aluno mais bem-humorado de Koellreutter consegue dar nó em qualquer pingo d’água e, com um mix particular de história econômica, cultural e social com neurociência e um bom punhado de melodias e refrões – talvez os mais fluidos de sua carreira – criou sua própria versão do sonho tropicalista. Partindo da ideia de que Caetano e Gil foram os verdadeiros responsáveis pela modernização do Brasil no pós-guerra, Tom Zé enfileira marchas, bossas, mambos, roques, faz Emicida segurar a cadência do flow e se aproximar do cantofalado apropriado pela MPB via repente, e canta em inglês sobre o metrô de Nova York. “Tropicalea Jacta Est”, peça central do disco, é um épico que renova a história tropicalista, dando a ela um peso de fundação semelhante ao que Fernando Pessoa dava em Mensagem às grandes navegações dos Lusíadas. É ali que, para Tom Zé, nasce o Brasil de Lula, do Orkut, do funk carioca – ou, como ele prefere, "a era do Pré-Sal". [Amauri Stamboroski Jr.]



6. Siba . Avante

Independente

"Mas a brisa por ser carinhosa / É quem mais tem castigado." A frase vem da segunda faixa do álbum de Siba, “Brisa”, e esse trecho é uma janela para o que este trabalho representa, tanto para o obra do ex-Mestre Ambrósio, quanto para a música brasileira de 2012. Avante é mais uma fase na caminhada de um artista em busca das raízes da sua linguagem, olhando para trás mas seguindo em frente. Depois do trabalho com o Mestre Ambrósio e o Fuloresta, que se inspiravam nos ritmos e folclore da Zona da Mata pernambucana, Siba quer expandir o horizonte olhando para onde tudo começou: na guitarra rock. A sensação é de que a brisa que incomodava o músico era o próprio rumo que a carreira dele havia tomado, e era necessária uma mudança. A guinada para o rock, segundo o próprio Siba, foi inspirada pelo guitarrista Fernando Catatau, após ter ouvido o disco O Método Tufo de Experiências, do Cidadão Instigado. A presença de Catatau em Avante é grande, como um fantasma guiando as canções por uma zona cinza entre o indie rock à lá Stephen Malkmus e Caetano Veloso. Avante é o ressuscitar de um “guítar” adormecido, um update que não soa esquizofrênico ou publicitário, procura na origem punk o que o passado recente não preencheu. [Eduardo Roberto]




5. Supercordas . A Mágica Deriva dos Elefantes
Midsummer Madness

Se os melhores álbuns de se ouvir são lugares, espaços quase físicos onde se possa morar, viver, o Supercordas fez em A Mágica Deriva dos Elefantes um sistema solar inteiro. Enfileirando referências geográficas, o quinteto carioca cria um universo de argonautas da mente, astrônomos imaginativos – ou astrólogos científicos –, alquimistas lisérgicos. O álbum pesca, de um lado, metáforas da história europeia, de outro, o melhor do tsunami criativo da primeira vaga psicodélica (aka 66-75), entre o kraut e Camões, entre Hendrix e Hermes Trismegisto, entre o positivismo e Geroge Harrison, tudo lido sob o prisma da díspar geração noventista de resgate lisérgico, de Mercury Rev e Flaming Lips a Super Furry Animals e ainda a Elephant 6.

Para além da referência não-sutil ao coletivo sul-estadunidense, A Mágica Deriva... parece traçar um paralelo direto com um fruto importante da família Elephant 6: Black Foliage..., do Olivia Tremor Control, com suas canções entrecortadas por efeitos sintéticos e visões espetaculares. Mas se esse rol de referências parece restringir o acesso à música, é besteira: são chaves para aquele mundo – algumas importantes estão compiladas na nossa matéria com o grupo, mas não são essenciais. Até porque há ainda nos Cordas um grande apreço pela melodia e refrões gentis como o de “Um Grande Trem Positivista”. Porém o segredo da persistência do álbum reside mesmo nas invenções, como a ponte Tião Carreiro-Ravi Shankar de “Declínio e Queda do Imperio Magnético”, a suíte do jazzy ao baggy de “Belo Horizonte” e a viagem de alta pressão de “Asclépius”. [Amauri Stamboroski Jr.]




4. Elma . Elma LP

Submarine Records

O Elma é hoje uma das mais importantes bandas de SP justamente por ter, desde o começo da carreira há dez anos, conseguido confundir a linha que separa o metal nacional, a música cabeçuda e a arte contemporânea. Fugir de forma criativa dos clichês é algo importante, principalmente quando há a chance de ser colocado no balaio de gato do metal brasileiro (aquele do Edu Falaschi e do Metal Open Air). O quarteto passou dez anos incubando, arquitetando, experimentando o som que resultou no LP, uma mistura de Neurosis, Godflesh, Steve Albini e industrial oitentista caótico como Einstürzende Neubauten. Tudo isso dentro encaixado de um jeito que reúne essencialmente o formalismo e o improviso, o “deixar soar”. Essa pegada estética, de ser quase uma instalação de arte (tanto que a banda se apresentou em galerias e exposições inúmeras vezes), era o passo que faltava para que o metal feito e pensado no Brasil pudesse passar de fase, se levar a sério enquanto música. Esse LP – e o Arabe Macabre do Test – é uma voadora nas costas da cena metálica paulistana, que aos poucos ressurge com a força criativa de outros tempos. [Eduardo Roberto]

Ouça aqui Elma LP


3. Síntese . Sem Cortesia

Matrero Records

Como uma voz que bate do fundo do seu crânio, sussurrando com raiva as verdades mais cegas com o tom de um profeta que você gostaria que estivesse mais louco do que certo, Sem Cortesia, álbum de estreia da dupla Síntese, é uma das melhores obras geradas pela tensão apocalíptica milenial parcelada século adentro até – ao que parece, na proximidade do fim do profético 2012 – hoje.

Com um produção seca e de baixa fidelidade, que empresta das técnicas do dub, além de uns pares de riddims, a capacidade de se criar um clima inevitável de “sangue-e-fogo”, o álbum se divide em dois discos apropriadamente intitulados “Vagando pela Babilônia” e “Em Busca de Canaã”. Dessa forma, Leonardo e Neto conseguem fundir o som ameaçador de um Wu-Tang Clan com a retidão sulfúrica de um Niney.

Podendo soar de rimas fáceis por causa da levada de curto suingue e por algumas escolhas mais óbvias em poucos momentos, na verdade o disco tem uma sofisticação lírica rude, com rimas internas e uma noção narrativa própria, declamada com um sotaque forte do Vale do Paraíba misturando gírias de quebrada com filosofia metafísica. Fruto de uma gnose muito particular, Sem Cortesia funde diferentes doses de rastafarianismo, heresias medievais reinterpretadas via Jung, combativo socialismo ontológico e outras crenças. Entrando sem pedir licença pela porta de trás, o Síntese distancia-se de qualquer rolê atual do rap nacional ao abrir sua própria trilha e criar o melhor produto da conexão rap nacional x música jamaicana desde a demo do Black Alien & Speed. Amém. [Amauri Stamboroski Jr.]




2. Psilosamples . Mental Surf

Desmonta

A música eletrônica é o estilo mais estica-e-puxa dos nossos tempos. Tudo pode ser considerado eletrônico, tudo pode ser processado, remixado, editado, refeito. E é lá em Pouso Alegre que um menino da roça conhecido como Zé Rolê usa justamente essas ferramentas para fazer um dos projetos mais interessantes da música descolada brasileira. E esse aspecto cool do Psilosamples vem justamente da utilização de texturas e processos da galera da música avançada, como Four Tet, James Ferraro e Aphex Twin, com samples inusitados como “Rebichada” (Chico Buarque & Os Trapalhões) e “Festa na Roça”, de Mario Zan. O importante é que o resultado é um grande mashup de memória afetiva, como se você estivesse ouvindo ao mesmo tempo John Talabot, trilha sonora do Sítio do Pica-Pau Amarelo, Clube da Esquina e vinheta de comerciais dos anos 80. Com um bom humor cotidiano - como nos títulos das músicas “Bom Dia Menina Pelada” e “O Príncipe da Roça” - o Mental Surf é como se você estivesse ouvindo a Internet. Tudo ao mesmo tempo, fragmentos de vídeos de YouTube, mixtapes no Soundcloud, mil abas abertas, caminhos que levam a caminhos que levam a caminhos. Mas tudo isso com um riso no rosto e um controlador MIDI. [Eduardo Roberto]


1. Metá Metá . MetaL MetaL

Desmonta

Nos últimos anos, a música africana tem voltado a despertar o interesse de vários grupos brasileiros e estrangeiros. A maioria desses grupos se fia em apropriações puramente estéticas, canibalizadas em contextos ocidentais com graus de sucesso variáveis. Considerar um diálogo mais profundo com aquela tradição, no entanto, exige a compreensão de algo mais amplo, a que o etnomusicólogo John Miller Chernoff chama “sensibilidade africana”. Para isso, em linhas bem simplificadas, é necessário investigar o papel da música nas diversas culturas do continente, e realizar uma imersão subjetiva nesse universo.

O grande trunfo do Metá Metá é ser capaz de realizar esse mergulho por completo, criando pontes com o ocidente e saindo do processo com uma música que não soa nem como modismo volátil, nem como academicismo anódino. MetaL MetaL é o exemplo mais bem acabado, e também o mais agudo, da perspectiva criativa desse grupo impressionante e raro, que foi definido recentemente como “uma abordagem afro-brasileira-free jazz-noise ao rock”. De fato, é a partir do conflito rítmico que o disco se constrói, explorando contrastes com a mesma persistência e rigor com que os organiza. A vitalidade de faixas como “Oya” e “Man Feriman” emana diretamente do poder de afetar as pessoas que esse conflito possui.

As nove músicas do disco trazem, por isso, um inevitável senso de convergência, que ora soluciona, ora apenas descreve as tensões primitivas geradas pelos diferentes registros musicais ali combinados. O Metá Metá sabe que esses registros são sobretudo humanos, e que a música, mais do que qualquer outra disciplina, tem o poder de nos conectar a eles. Em um mundo onde fim e recomeço, apatia e revolta, progresso e atraso parecem caminhar cada vez mais para um ponto de resolução, esse tipo de compreensão não poderia ser mais valioso. [Mateus Potumati]

Ouça aqui MetaL MetaL


Além do top 20: outros discos citados na eleição da Soma

21. Gaby Amarantos . Treme  
22. Tulipa . Tudo Tanto  
      VICTIM! . Sexually Reactive Child
24. Terra Preta . Homem Figa Vol. 1
25. Céu . Caravana, Sereia Bloom   
26. BNegão e os Seletores de Frequencia . Sintoniza Lá  
     Rodrigo Campos . Bahia Fantástica       
     Sambanzo . Etiópia   
29.  Black Drawing Chalks . No Dust Stuck On You
     Chinese Cookie Poets . Worm Love
     Matheus Mota . Desenho
     Mnemosine 5 . Mnemosine 5
     Silva . Claridão
34. The Renegades of Punk . Coração Metrônomo
35. Constantina . Pacífico
36. Maga Bo . Quilombo Moderno
37. Abayomy Afrobeat Orchestra . Abayomy
     Amabis . Trabalhos Carnívoros
     Ba Kimbuta . Universo Preto Paralelo
     Dudu Tsuda . Le Son Par Lui Même
     Juliana Perdigão . Álbum Desconhecido
     Macaco Bong . This Is Rolê
     Madrid . Madrid
     Mão de Oito . Um Dia Que Já Vem
     O Inimigo . Imaginário Absoluto
     OQuadro . OQuadro
     Otto . The Moon 1111
     Pazes . Limbo
     Projetonave . Asunzion
     Shaw . Introdução Para Orquestra Simbólica
     Sobre A Maquina . Sobre A Máquina
52. Bemônio . Vulgatam Clementinam
      Bonde do Rolê . Tropical Bacanal
54. Lupe de Lupe . Sal Grosso
55. Garage Fuzz . Warm & Cold
      Sexy Fi . Nunca Te Vi de Boa
57. Bemônio . Serenata
      Curumim . Arrocha
      Laura Wrona . RH Volcano
      Merda . Índio Cocalero
      Negro Leo . Ideal Primitivo
      Negro Léo . The Newspeak
      The Cigarettes . The Cigarettes

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